A geóloga e paleontóloga Diana Mussa foi a primeira paleobotânica brasileira de prestígio internacional, legando-nos uma meticulosa e volumosa obra e sendo reconhecida como autoridade mundial em floras do Devoniano.
Natural de Campos dos Goytacazes (RJ) e filha dos imigrantes Nagib David Mussa e Maria Chacur Mussa (provenientes de Trípoli, no Líbano), em 1952 Diana mudou-se para o Rio de Janeiro e ingressou na Faculdade Nacional de Filosofia, Ciências e Letras da então Universidade do Brasil (atual UFRJ), para cursar História Natural. Ali foi colega de turma de Maria Martha Barbosa e aluna dos professores Júlio Magalhães e Nicéa Magessi Trindade.Inquieta, dedicada e com sede de saber, cursou também o curso de Geologia na mesma instituição. Neste período, aprofundou seus estudos realizando estágios com grandes pesquisadores, tanto da Botânica, quanto da Geologia. Desta maneira, adquiriu toda a base para a preparação e o estudo de madeiras atuais com o Dr. Fernando R. Milanez, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, além de receber apoio dos paleobotânicos Friedrich Wilhelm Sommer, Elias Dolianiti e Richard Kräusel. Em sete de março de 1958 junta-se a quinze outros paleontólogos pioneiros para fundar a Sociedade Brasileira de Paleontologia e participar, no ano seguinte, do I Congresso Brasileiro de Paleontologia, ocorrido no Rio de Janeiro1,2.
Diana exercia atividades docentes como um verdadeiro sacerdócio, começando em 1949 como professora de Ciências Naturais no ensino básico do estado do Rio de Janeiro. Ao final da década de 50, movida pelo seu intenso amor ao próximo e desejo de se dedicar aos desvalidos, ingressou na Ordem de Santa Clara e assumiu uma vida consagrada. Como Irmã Clarissa foi enviada para dirigir um colégio em Manaus. Em 1958 seguiu para a cidade de Tefé, onde manteve pesquisas com madeiras fósseis em paralelo à missão religiosa que ali assumiu. Mais tarde, em 1961, necessitou retornar à cidade natal para um tratamento de saúde.
Um dos troncos da Formação Botucatu de Uberlândia levados para uma marmoraria na cidade e dali resgatados pelo professor Luiz Nishiyama (IG-UFU) e reportados em 1972 pelos geólogos Kenitiro Suguio e Armando Márcio Coimbra. Foto extraída de Suguio & Coimbra (1972).
Pouco depois de retornar do Amazonas, Diana foi contratada como técnica pesquisadora na Comissão Nacional de Energia Nuclear e, em 1973, iniciou seus estudos de pós-graduação no Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo sob a orientação do Dr. Antônio Carlos Rocha-Campos (1937-2019). Nesse período, recebe partes de troncos permineralizados provenientes de afloramentos localizados na então Fazenda Sobradinho, em Uberlândia (atualmente cercanias do IFTM, campus Uberlândia), afloramentos esses identificados em 1972 pelos geólogos Kenitiro Suguio e Armando Márcio Coimbra como sendo da Formação Botucatu da Bacia do Paraná3. Através de estudos detalhados com o objetivo de identificação e descrição das amostras, Diana Mussa correlaciona os materiais da Formação Botucatu à estrutura das atuais Pinaceae por suas afinidades morfológicas, introduzindo-os então no grupo Protopinaceae. Após análises detalhadas, encontra certas afinidades com os gêneros Pinuxylon e Protopinuxylon , mas as pequenas divergências entre os grupos e o material uberlandense a levam a descrever em 1974 o novo gênero Palaeopinuxylon, afim ao atual gênero Pinus , e contendo a espécie Paleopinuxylon josuei, a terceira espécie descrita em sua carreira até então, e com a qual homenageia seu amigo e colega paleontólogo Josué Camargo Mendes (1918 - 1991)4. Em 1982 defendeu sua tese, com louvor, versando sobre as lignitafofloras permianas da Bacia do Paraná.
A agora doutora Diana Mussa passa a trabalhar como pesquisadora do Departamento Nacional de Produção Mineral, mas já em 1983 foi requisitada pelo Museu Nacional. Assim, passou a realizar pesquisa, orientar alunos e ministrar disciplinas de Paleobotânica, Paleobiologia Florística e Evolução, Paleoecologia e Geologia Geral no Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas (Botânica) do Museu Nacional, e a colaborar em disciplinas no Programa de Pós-graduação em Geologia do Instituto de Geociências, ambos da UFRJ. Em 1993, após passar por concurso público, foi nomeada como Professora Adjunta no Museu Nacional. Ao longo de sua carreira, Diana Mussa descreveu trinta e três novos gêneros de plantas fósseis, e foi homenageada com o gênero Mussaeoxylon Merlotti, 1998.
Além de manter suas atividades acadêmicas, em meados da década de 1990 Diana retornou à vida religiosa como irmã leiga ligada à Arquidiocese do Rio de Janeiro e dedicando-se a tarefas espirituais e ao estudo e ensino do hebraico. Em 2003, com tristeza, pois sentia que ainda poderia colaborar muito, aposentou-se compulsoriamente aos 70 anos, e afastou-se por completo das atividades no Museu Nacional. Apenas quatro anos depois, sem qualquer enfermidade, deixou este mundo sem sofrimento, vítima de parada cardíaca, no dia 8 de maio de 2007.
Diana Mussa viveu profundamente a paixão pelo seu trabalho. Foi uma mulher determinada e competentemente se impôs em um campo até então absolutamente masculino. Realizou seu sonho de criança e tornou-se naturalista em sentido amplo. Ao escolher a Paleobotânica, assumiu todas as dificuldades inerentes à uma linha de pesquisa que praticamente inexistia no Brasil, principalmente ao se dedicar à anatomia de madeiras fósseis. Desenvolveu todas as habilidades necessárias à pesquisa com maestria, desde a prospecção de fósseis em campo; em laboratório, dedicou-se à difícil preparação destes fósseis para estudo, atentando sempre para os diferentes materiais e adaptações das técnicas existentes; além disso, ao microscópio, era extremamente criteriosa em suas observações e não se contentou em fotografar amplamente os materiais, ilustrando em nanquim a anatomia dos lenhos fósseis, com a grande lucidez de interpretá-los tridimensionalmente. Seus "porquês" sempre foram muito além da mera descrição morfológica ou anatômica dos fósseis, pois preocupava-se com questões de desenvolvimento e evolução das plantas que estudava, assim como a reconstrução de seus ambientes de vida e de morte, pois tinha grande interesse também pela tafonomia. Com uma carreira belíssima, mesmo tendo publicado apenas em português, é reconhecida internacionalmente como a maior paleobotânica que o Brasil já teve.